segunda-feira, junho 25, 2007

Esboço de Partida

Seria triste dizer-te adeus, pensei na hora da partida. Seria triste dizer adeus a todos os passos, a todas as escadas que subimos juntos, a todos os bancos onde nos sentámos, a todas as nuvens onde pousámos os nossos sorrisos. Seria triste sorrir-te com lágrimas para te dizer que vou para mais uma etapa, que vou em busca dos mesmos sonhos que trouxe debaixo do braço, como espiga levada pelo vento.
Ainda ontem a aragem doce dos sonhos nos tolhia os rostos assustados de meninos e hoje é o vento de norte a embalar-me os passos, a dizer-me que não posso mais ficar, a provar-me que as minhas pernas se tornaram demasiado pesadas para o caminho a percorrer.
Separam-nos duas portas, dois mundos, duas vidas…separam-nos um adeus e um até já que nunca serei capaz de pronunciar. Mentir-te-ia em ambos os casos, e tu bem sabes, que nas artes da falsidade careço de engenho e perícia.
Mas, afinal, nada muda quando os sonhos permanecem no lugar da memória.
Deixa os teus livros em cima da mesa, amanhã outros olhos olhar-te-ão atentamente, outras mãos buscarão as tuas procurando antídoto para os males do mundo, outros pensamentos se cruzarão com a tua vontade de viver.
Talvez amanhã te lembres de mim, do rosto vago e indefinido por entre os semblantes da multidão, do sorriso maroto e do gesto indelével demarcado no teu coração.
Nunca te direi adeus, nunca caminharei solitária pelo corredor que nos separa para te dizer aquilo que trago junto ao peito. Amanhã, quando perceberes a minha ausência, tenho a certeza que te recordarás dos silêncios entre uma e outra conversa, das pausas amistosas entre sorrisos, e nesse momento, não precisarás de palavras para saber que te adoro.
Vejo-te ainda ao fundo, tento erguer a mão, esboçar algo parecido com um gesto de partida, mas, de pronto, o coração diminui-me os braços para me encher a alma, encolhe-me os dedos para me esticar o sorriso.
Como se diz adeus, quando queremos ficar?
Se ao menos pudéssemos aprender tudo na escola…

Isa Mestre