sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Segredo

Escrever-te o sorriso, olhar-te por dentro, amar-te sem me envolver, sem me deixar tocar pela doçura das palavras ditas, dos gestos continuamente repetidos na minha memória.
Olhei-te durante anos e desejei apenas o parágrafo mais sincero, o mais puro, aquele em que a tua beleza pudesse ofuscar unicamente os olhos de quem me lê, de quem me acredita apaixonado, e se apaixona tantas vezes pelos meus amores.
Perguntas-me se te amo, faço uma pausa, a dureza das palavras pode ferir-te, a crueldade da verdade impedir-me-á de voltar a ver-te sorrir.
- Amo-te como nunca ninguém te amou.
Não te minto. Estou certo de dizer-te toda a verdade. Amo-te como nenhum outro homem pode amar-te, porque te amo o sorriso e não a tua forma de sorrir, porque te amo as palavras e não tudo aquilo que dizes com elas, porque te amo a naturalidade e não a sensatez.
E enquanto os outros te olham com as mãos repletas de prazer e desejo, eu olho-te e amo-te com as palavras que escrevo, com os adjectivos sempre ridículos e incapazes de classificar-te, de dizer-te que és a mulher mais bela do mundo.
Chegará o dia em que ousarás estar cansada de mim e dos meus papéis, de mim e do meu olhar constante, da ânsia de quem quer ver tudo sem ver, na verdade, absolutamente nada.
O editor pede-me mais, desconfio que gosta da mulher que há em ti, da essência que se esconde por detrás do rosto sério e do olhar expressivo. Conhece-te sem nunca te ter conhecido. Apaixonou-se por ti mais do que pelas minhas palavras.
Escrever-te-ia uma carta de amor, se não se achasse ridículo, se não se olhasse ao espelho todos os dias sentindo-se miserável por amar-te sem saber que te ama, por pensar na mulher que lê nos meus livros, na mulher que ele crê que não existe e está cada vez mais próxima de si.
Revelar-te ao mundo seria acreditar que os homens alguns dia poderão olhar-te por dentro.
Por isso, serás sempre o meu segredo.

Isa Mestre