Encosto o nariz contra o espelho e vejo-te do outro lado, e a mãe sempre a dizer:
- tem cuidado, não vás para longe,
E tu a distanciar-te cada vez mais de ti, a ficar cada vez mais próximo do outro que não te pertence.
Um dia olhar-te-ás ao espelho e não te reconhecerás, porque na verdade, não será a tua imagem reflectida, não serão esses teus olhos brilhantes de criança que nos faziam lembrar estrelas em noites de Verão.
Não te percas,
Não vais para longe,
Sempre a minha voz a perseguir-te, a pedir-te que fiques e sejas feliz, a mostrar-te que a loucura reside em nós mesmos.
Talvez outros se tenham olhado nesse mesmo espelho e pensado o que pensas agora, talvez outros tenham pesado as vitórias e as derrotas, acreditando que isso pode determinar quem sai vencedor ou vencido do duro jogo da vida.
E tu permaneces estático em frente a um espelho de um hotel qualquer, numa cidade qualquer onde te olham como se fosses um bicho (onde tantas vezes te perguntas se não somos, afinal, todos bichos). Paraste apenas para retocar o cabelo, ajeitar o visual, e agora…olha para ti! Que fazes? Interrogaste-te? Pensas? Sonhas? Choras ou sorris?
Será que sabes quem és (será que sabemos quem somos, afinal?)?
Desconheces agora as causas que te impedem de prosseguir, que te acorrentam os pés à tua própria existência como se aquele momento fosse a confirmação completa de que não somos absolutamente nada.
Por instantes recordas as palavras da mãe (não vale a pena esconder, sei que as recordas), pensas no seu olhar doce, no gesto terno, no sorriso afável.
Não és o primeiro nem serás o último. Também eu já sorri ao espelho tentando encontrar a alegria de mim, já me perguntei quem era por me julgar tantas vezes incapaz de me encontrar, já parei e pensei, já escrevi histórias de amor, como as que escreves agora.
As palavras saltam-te da alma e acreditas-te louco, pensas que será a última coisa que fazes porque dali a nada todos te acharão demasiado ridículo para casar e ter filhos, para contar histórias de encantar e embalar berços de meninos.
Cogitas sobre o quão inútil te tornaste, despes o fato do outro que há em ti e vês-te nu ao espelho.
Será que algum dia te vais encontrar? Será que alguma estrada te poderá indicar qual o melhor caminho a seguir?
Tem cuidado, não vás para longe. Não te sintas perdido, pois só se perde quem há muito desistiu de se encontrar.
Isa Mestre
domingo, novembro 18, 2007
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