segunda-feira, março 22, 2010

Sem medo

A poesia são os teus olhos quando me olhas e não sei como escrever-te.
A poesia está longe de ser tudo aquilo que um dia quiseste que fosse. A poesia não sou eu nem as minhas palavras. A poesia é simplesmente a poesia.
Cada momento. Sim, talvez a poesia seja cada momento.
Como este em que os meus dedos voltam a tocar novamente o papel. Três meses depois. Não há rasto de saudade. Apenas uma dor. Uma ligeira frustração. O medo. Sim, também o medo.
Desculpa se já não sei como agradar-te. Desculpa se a brevidade do papel me retirou sinceridade nos gestos.
Queria abraçar-te. Não sei como fazê-lo. Agarrar-te? Dizer-te que te adoro? Poderia fazê-lo ignorando que vivemos todos na poeira do ridículo, na distância ínfima que vai do meu coração ao teu.
Queria pedir-te que viesses. Que viesses sem porquês, sem respostas pensadas, sem sorrisos ensaiados. Apenas tu.
Nua. Despida de palavras sem sentido. Como as árvores no Outono.
Como gosto de ver-te.
Pediste-me que esquecesse as palavras cruéis, que agora , que estou a morrer, me lembrasse apenas das coisas boas.
Pudesse eu dizer-te como nos tornamos tristes na hora da partida, como perdemos capacidade de recordar, como nos tornamos máquinas autodiegéticas com um só rumo, uma só canção.
Cantas para mim? Cantas quando as luzes se apagarem e o medo me habitar o peito?
Cantas quando as enfermeiras cansadas do meu corpo chamarem a morte para me vir buscar?
Cantas. Eu sei que cantas. Cantas baixinho no meu ouvido. E nesses momentos, a tua voz é a minha poesia. Todos os versos que nunca escrevi. Todos os momentos que nunca vivi. Todas as tristezas que sendo minhas nunca deixaram de te pertencer.
Todos os medos e todas as mágoas.
Mas eu vou, se cantares para mim eu vou sozinho. E sabes que mais? Até vou sem medo.

3 comentários:

Breve Leonardo disse...

[não sei exactamente onde está, a poesia... sei que a respiro, e tal como o ar que me mantém vivo, assim a poesia do mundo esconde-se do olhar, mostra-se aos sentidos, ao passo breve e ao ouvido atento... onde está a poesia? Não sei, talvez por aqui, talvez por aí, em todo o lado]

um imenso abraço, Isa

Leonardo B.

Anónimo disse...

A poesia está em todo o lado, desde o lado de fora até ao lado de dentro do coração. Está nas palavras ditas e nas não ditas, nos gestos de ternura que afastam os medos e os receios, nas coisas que nos marcam pela positiva e até mesmo num simples olhar ou um até breve. Há poesia em cada um de nós. Tu és poesia! Ela agita-se dentro de ti sempre que escreves mais um texto assim.

Anónimo disse...

Revejo-me tanto naquilo que escreve, que até me emociono ao ler as suas palavras.
De uma novata por estes lados, obrigada