domingo, janeiro 07, 2007

Músicos do Tempo

Subitamente as minhas mãos que se agitam, os meus dedos a mover-se como se diante de mim ainda estivesse o piano onde tocámos tanta vida e construímos tantos sonhos.
Sabes…só hoje entendi que nunca soube tocar piano. Que as minhas mãos não foram mais que instintos do coração, movimentos da alma, sorrisos de dentro do mais profundo de mim.
Eu não sabia tocar piano, eu sabia tocar profundamente nesse coração gelado pelo tempo, pela mágoa e pela dor.
Hoje, sento-me sozinho ao piano e as mãos são analfabetas nessas teclas cansadas do meu olhar ingénuo e perdido.
Onde estão as partituras do nosso amor? Onde?
Perdidas pela casa onde já não existo, onde os meus passos se perdem na tristeza de viver sem ti? Onde?
Escondidas por detrás desses muros altos a que chamamos de solidão? Para além dessa fronteira de estradas e caminhos que nunca percorri?
Oxalá pudesse ir buscá-las, reaprender a tocar essa melodia tantas vezes repetida no silêncio inócuo dos nossos dias.
Mas não posso. Tu sabes que não posso.
Porque ainda gritas lá longe,
- Fica.
Eu fico, não te preocupes, eu fico com a tristeza semeada no lugar do amor, com algo que bate mas não é coração, com algo que sente e não é alma.
E a tua voz lá no fundo,
- Não serves para nada!
Tens razão. Não sirvo para nada. Vão longe os tempos em que o meu sorriso era a alegria no teu olhar, em que os meus dedos se deslocavam suavemente sobre os teus na magia de quem faz da música o derradeiro caminho para a felicidade.
Hoje é tudo ilusão. Sou um vagabundo solitário de mãos vazias e coração aberto.
Não sou músico, como outrora me chamaste, não sou amor, como soletravam os teus lábios na doçura das tardes quentes de Outono. Sou estes dedos que não se cansam de chamar por ti, sou esta música que ecoa no ar sem nunca atingir o seu verdadeiro destino, sou um pássaro de olhos vendados em busca do seu rumo e do seu ninho.
Junto de ti. É aí o meu lugar. Mesmo que digas que não presto e que me queres longe, mesmo que finjas que esqueceste para te entregares nas partituras de outra vida.
Serás sempre aquilo que sou.
Nada mais, nem nada menos que isso. Afinal, nascemos para o que somos.

Isa Mestre

3 comentários:

Felipe disse...

sinto-me um pássaro de olhos vendados qdo o mundo para mim é a existência. o q me consola é q para encontrar ninhos de amores não são precisos olhos...
e se eu nasci para ser o q sou eu acho q devo dizer q tenho orgulho de ter nascido. para voar!

Musicologo disse...

Pediste opinião aqui a tens, apenas opinião, apenas isso :P

Citando Miguel Marques,
"o que me irrita nestes jagunços é terem a mania que são escritores. Afiam o lápis à Lobo Antunes, glosam os romances do homem, escrevem em escadinha
e
tudo,
verbos no infinitivo,parêntese a entremear as orações
(nem o dia é dia se não houver parênteses a entremear as orações),
polifonia, diálogos repetidos. Era uma tragédia, faltarem os diálogos repetidos (...)"

O esteriótipo por ele descrito encaixa um pouco aqui. Muito bem escrito, sem dúvida, mas talvez com clichés demais e referências reduzidas. Se eu fui acusado de concursite por ser original demais para tentar chocar pela diferença eu diria que tu talvez sejas um pouco "mais do mesmo". Alarga mais as referências, mistura mais coisas sem medo. Mais humor, mais non-sense, mais distanciamento (um abuso do "eu" que já não se suporta!), mais multiculturalidade... enfim: diversifica. ;)*

joeindian disse...

Eu não gosto do estilo deste texto. Contudo, não me parece que a página 36 da 6ª de 5 de Janeiro de 2007 tenha alguma coisa a ver com o caso. Mas originalidade, diferença e água benta, cada uma toma a que quer. Mesmo sendo este um comentário a pedido.